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27/01/2019
Estresse, má alimentação e sedentarismo são conhecidos causadores de câncer em todo o mundo. E em São Paulo, há mais uma razão para se preocupar: a poluição expelida pelos 8,6 milhões de veículos aumenta a incidência de câncer no aparelho respiratório, segundo dois estudos publicados no último ano nas revistas científicas Cancer Epidemiology e Environmental Research. Desenvolvidas pelo pesquisador do mineiro Adeylson Guimarães Ribeiro, 44, as pesquisas cruzaram a concentração de automóveis e casos de câncer. E chegaram a uma proporção.
"O aumento na densidade de tráfego em relação ao valor médio esteve associado a um acréscimo de pelo menos 7% na incidência de câncer do aparelho respiratório"
Adeylson Guimarães Ribeiro, doutor em saúde pública pela USP
O levantamento faz parte da tese de doutorado defendida por Ribeiro em 2018 na Faculdade de Saúde Pública da USP. Ele é membro do Núcleo de Pesquisas em Avaliação de Riscos Ambientais. Ribeiro se inspirou em estudos semelhantes na Europa, América do Norte e Ásia para encontrar um método que se adequasse à cidade com mais habitantes do Brasil.
O pesquisador utilizou duas bases de dados: uma para mortalidade por câncer de aparelho respiratório da Secretaria Municipal de Saúde, que registrou 19.500 mortes entre 2002 a 2013, e outra do Registro de Câncer de Base Populacional de São São Paulo, que registrou as 15.411 ocorrências para esse tipo de câncer entre 2002 e 2011. No primeiro estudo, Ribeiro utilizou a divisão do IBGE para a cidade, que contabiliza 310 áreas; no segundo, trabalhou com 6.384 divisões.
"Transformamos o município em áreas de 500 metros quadrados para descobrir a influência dos poluentes em cada uma delas", afirmou o pesquisar ao UOL.
O estudioso, então, utilizou uma fórmula com base na densidade de carros. Ele chegou a um número para cada área ao considerar informações como volume de tráfego e quantidade de ruas. "Nosso estudo sugere que quanto maior a densidade de veículos em uma região, maior o risco para a incidência e mortalidade por câncer respiratório", diz.
Poluição que mata
De acordo com a OMS (Organização Mundial de Saúde), 4,2 milhões de pessoas morreram em 2016 em todo o mundo por doenças atribuídas à poluição do ar. No Sudeste do Brasil, foram 12.533 mortes por câncer de traqueia, brônquio e pulmão, informa o Inca (Instituto Nacional de Câncer). Para 2019, são estimados 31.270 novos casos em todo o país.
Oncologista no Centro Paulista de Oncologia, Denise Leite diz que alguns poluentes do meio urbano estão relacionados não só a câncer do pulmão, mas a outras doenças respiratórias, "mas isso não estava totalmente explicado".
"Os efeitos nocivos do cigarro para o aparelho respiratório já era uma certeza. Outra coisa é descobrir que o meio que o próprio ser humano criou e vive nos coloca em risco"
Denise Leite, oncologista clínica do Centro Paulista de Oncologia.
Pobres sofrem mais
No segundo estudo, o brasileiro contou com a ajuda de um pesquisador holandês. Eles consideraram a cidade em quatro regiões de acordo com seu desenvolvimento social, o IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal). "A gente tratou essas áreas como cidades independentes, com modelos para áreas de IDHM baixo (onde vivem os mais pobres), médio, médio-alto e alto."
A surpresa foi descobrir que, embora a população mais rica viva em regiões com movimentação maior de carros, quem mais adoece com a poluição são os moradores da periferia. "Eles sofrem mais o impacto da poluição porque ficam muito tempo no trânsito, no deslocamento do trabalho para a casa. Algumas pessoas chegam a ficar seis horas dentro de um ônibus todos os dias", diz o pesquisador.
Apesar de caminhões e ônibus representarem apenas 5% da frota na cidade, esses veículos movidos a diesel respondem por metade da poluição do ar em São Paulo, revela estudo do instituto de Física da USP. "Além de ficarem expostos a essa poluição, que em alguns casos é maior dentro dos coletivos do que fora, essas pessoas passam tanto tempo no trajeto que não conseguem se dedicar a atividades físicas ou preparar refeições saudáveis. Elas também têm menos acesso a serviços de saúde.".
Emprego na periferia e frota elétrica
Para o pesquisador, algumas políticas públicas poderiam reduzir não apenas os índices de poluição veicular na cidade, como salvar a vida de milhares de paulistas que vivem na periferia. "É necessário substituir os ônibus a diesel por veículos elétricos, como já vem ocorrendo na Europa, e ampliar a rede de metrô em São Paulo. Com uma rede de transporte melhor, muitos trabalhadores poderão deixar o veículo na garagem durante a semana."
"Também é muito importante considerar a criação de postos de trabalho na periferia para reduzir o tempo dentro do ônibus. A qualidade de vida dessas pessoas vai aumentar ao mesmo tempo em que a exposição aos poluentes também vai diminuir" .
Adeylson Guimarães Ribeiro, pesquisador da USP
Fonte: UOL
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